domingo, 7 de junho de 2020

Literatura: "Raul Seixas: Não Diga Que a Canção Está Perdida" e "Filhos de Sangue e Osso"


Em 416 páginas, o crítico musical e repórter Jotabê Medeiros (que em 2017 publicou o ótimo “Belchior: Apenas Um Rapaz Latino-Americano”) narra a vida do baiano Raul Seixas, um artista de imensurável talento que ainda hoje é cultuado por uma legião de fãs em todo o país apesar de ter falecido há mais de 30 anos, mais precisamente em 21 de agosto de 1989. “Raul Seixas: Não Diga Que a Canção Está Perdida” da Todavia Livros publicado em 2019 é uma obra para entender um pouco mais da magia, da loucura e dos processos artísticos de um músico de extensão nacional que gravou clássicos e mais clássicos em seus discos. Como uma biografia deve verdadeiramente ser passa longe de somente afagar o biografado e procura mostrar Raul com todos os defeitos que tinha, além de tocar em pontos bem sensíveis e polêmicas que geram discussão mesmo nos tempos atuais como a prisão do escritor Paulo Coelho pela ditadura (eram parceiros na época) e as apropriações de músicas estrangeiras como base para as próprias composições. Entre o genial, o místico e o rebelde, Raul carregava dentro de si alguns demônios e vícios que o fizeram sucumbir cedo demais, contudo não sem antes tatuar versos e acordes nos corações de milhares. Como diz um trecho do livro: “agregador e ao mesmo tempo solitário, transitou por variados mundos criativos, selecionando de cada um deles as ferramentas necessárias para compor o seu próprio universo”. Raul era isso mesmo, um carpinteiro. Um carpinteiro do universo.

Nota: 8,0


“Filhos de Sangue e Osso” (Children of Blood and Bone) é o primeiro livro da escritora nigeriana-americana Tomi Adeyemi que após se graduar em literatura inglesa em Harvard veio para Salvador estudar sobre mitologia, religião e cultura africana, o que influenciou na criação desse trabalho. Publicado nos USA em 2018 ganhou edição nacional no mesmo ano pela editora Rocco com 560 páginas e tradução de Petê Rissatti. É o primeiro da trilogia “O Legado de Orïsha” (o segundo já saiu lá fora, mas não aqui) e está sendo adaptado para o cinema. Direcionado para o público jovem adulto é daquelas obras que ultrapassam as fronteiras que lhe são arregimentadas e alcançam leitores de diversas esferas. “Filhos de Sangue e Osso” é na essência uma fantasia que usa a mitologia iorubá e os orixás como condutores e no seu cerne aborda temas como opressão, preconceito, racismo, abuso de poder, ancestralidade e a coragem de lutar para mudar as coisas de lugar. Temas que são tratados com uma força assombrosa para uma estreia. A jornada de Zélie, Amari e Tzain para tornar o reino em que vivem um lugar mais justo para todas as raças, credos e tipos, brigando com o coração na ponta da espada, do machado e do bastão para remover um tirano do trono é daquelas que acalenta a alma e se torna ainda mais impactante depois que se lê o texto no final que correlaciona a obra com a realidade dura e cruel dos tempos em que vivemos.

Nota: 9,0


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