Vencedor do Prêmio Camões de
2019, Chico Buarque lançou outro livro no ano passado pela Companhia das Letras
com 200 páginas. “Essa Gente” tem como protagonista um escritor
mergulhado em tremenda crise que atinge tanto o lado criativo, como também o
amoroso e financeiro. Com o segundo casamento tendo ido para o brejo, o
dinheiro acabando, uma relação inerte com o único filho e a incapacidade de
escrever um novo romance pelo qual já recebeu alguns adiantamentos, a vida está
na beira de um colapso. Usando o Rio de Janeiro atual como palco para contar
essa história, Chico Buarque aproveita e insere a cada capítulo retratos claros
de um Brasil governado pelos ineptos e energúmenos de hoje em dia e sua relação
direta com a violência e intolerância que saiu do esgoto das redes sociais para
o dia a dia do convívio, além, é claro, da violência física em si. Escrito
quase que em forma de diário, o autor apresenta a queda do escritor Manuel
Duarte alternando - como de costume em seus livros - realidade com imaginação e
delírio. O resultado é melhor que os últimos trabalhos (“O Irmão Alemão” de
2014 e “Leite Derramado” de 2009) e expressa um autor em boa forma, ainda que
sempre se espere algo extraordinário por ser quem é. Indo além do personagem principal, “Essa
Gente” se destaca mesmo é pelos coadjuvantes pequenos que de uma forma ou
outra representam bem o tipo de pessoa que nos colocou no buraco em que
estamos.
Nota: 7,5
Leia um trecho: https://www.companhiadasletras.com.br/trechos/14803.pdf
Nunca existiu mulher como
Fernanda Montenegro no Brasil. A atriz é daquelas artistas únicas que possuem um
legado enorme e que além de serem imensos em termos de qualidade se tornaram
igualmente ícones de uma geração, de um ofício. Seja no teatro ou no cinema (e
até mesmo na televisão), foram milhares aqueles que sorriram, choraram e se
emocionaram ao ver um trabalho seu. Em “Prólogo, Ato, Epílogo” publicado
no ano passado pela Companhia das Letras com 392 páginas ela conta com a colaboração
da Marta Góes para versar um pouco sobre esses 90 anos de vida, sendo a
esmagadora parte deles dedicado a arte, a paixão por atuar. De maneira terna e
afável, mas não menos forte e contundente, a autora conta sobre a infância, os
antepassados, as primeiras apresentações, o amor eterno pelo companheiro
Fernando Torres, os perrengues para se fazer teatro no Brasil desde sempre, as
viagens, as desilusões políticas e sociais, os anos de ditatura militar, a
garra de sempre promover um novo espetáculo, uma nova peça, a glória e o
reconhecimento. Sempre tendo as transformações do nosso país consideradas passo
a passo com reflexões curtas sobre cada momento e desdobramento, a leitura
dessa biografia é daquelas que a cada página virada temos um novo deslumbre,
uma nova comoção, um novo ensinamento. Dona de uma memória incrível, temos casos
antigos apresentados com detalhes e a todo momento levando em conta a finitude
do tempo que temos por esse plano. Um livro primoroso de uma vida gigantesca.
Nota: 9,0
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