“Deuses Americanos” é provavelmente o melhor livro de Neil Gaiman.
Entre tantos que o consagrado autor já fez é o que mais se destaca. Lançado
originalmente em 2001, ganhou uma excelente adaptação em formato de série televisiva
(está disponível na Amazon Prime Video) e agora também se aventurou para os
quadrinhos, seara que Gaiman domina como poucos e concebeu obras-primas.
Publicada originalmente nos EUA pela Dark Horse, a Intrínseca lançou
recentemente aqui o primeiro dos três volumes previstos chamado “Sombras”. Com 264 páginas em formato
17x26cm, a obra tem tradução de Fernando Scheibe e Leonardo Alves e apresenta
diversos extras como esboços e capas alternativas que dão um plus e tanto. A
adaptação ficou sob a responsabilidade de P. Craig Russell (Doutor Estranho) e
Scott Hampton (Sandman) que nesse primeiro arco trazem Shadow Moon saindo da
prisão e tendo que lidar com a morte da esposa e o encontro com o misterioso
Wednesday que o insere em uma misteriosa guerra travada entre os deuses antigos
das mitologias de cada país que chegaram aos EUA através dos imigrantes e os
novos deuses dos dias atuais (como internet, mídia, etc.). Com algumas mudanças
sutis no texto e na formatação, essa nova investida fica bem abaixo do esperado
para quem já conhece a obra (seja do livro ou série), devendo funcionar melhor
para os neófitos.
Nota: 6,0
Veja mais aqui: https://www.intrinseca.com.br/deusesamericanos-sombras
“Composto no ano de 2017, durante a longa noite que se abateu sobre o
país, período de vigência do golpe de agosto de 2016. Ainda que não verse sobre
ele, sua sombra pode ser notada em todo o canto”. É o que escreve Alcimar
Frazão no final do novo trabalho “Cadafalso”
e realmente percebemos que essa sombra permeia tudo. Com 128 páginas, formato
grande (21x27cm) e uma edição caprichada da editora Mino, o quadrinista viaja
por Florença, Barcelona, São Paulo e Porto Alegre em anos e épocas distintas em
contos que tratam da vida, do existir e dos absurdos que circundam isso. A arte
em preto e branco alcança níveis ainda mais elevados do que em “O Diabo e Eu”,
obra anterior do autor, e os contos trazem parcerias com nomes como Lourenço
Mutarelli, Magno Costa e Dalton Cara. Do artista renascentista obcecado com a
própria arte e religião, passando pelo motoboy que corre sem parar pela capital
paulista, temos histórias que não são fáceis, carregam um cunho existencial, às
vezes com poucas palavras e em outras usando projeções mentais, mas sempre com
o impacto poderoso da arte. A história final que traz um velho recluso, cheio
de delírios de grandeza e paranoia carregando dentro de si um moralismo
demasiado e nocivo é a cereja do bolo de um álbum pesado e vigoroso.
Nota: 8,5
Jeremias é um raro personagem
negro dentro do mundo concebido por Mauricio de Sousa. Estreou em 1960 e desde
então tem sido mero coadjuvante nas histórias da turminha, encabeçando poucas
aventuras solo nesses anos. Isso muda com “Jeremias
- Pele”, mais um trabalho dentro do projeto Graphic MSP (o 18º) desta vez
comandado por Rafael Calça e Jefferson Costa, e, talvez, o mais importante até
agora. Com 98 páginas e publicação pela Panini Comics, os autores apresentam o
protagonista no convívio com a família e na sua escola, onde depois de um dever
sobre profissões encaminhado de maneira desastrosa pela professora, começa a
sofrer preconceito mais severamente, por mais que este sempre estivesse
presente ao redor. O texto insere situações cotidianas que os autores já
passaram ou presenciaram na escola, no trabalho, na esquina, na rua. Situações
que também vimos quando crianças - em maior ou menor escala - e temos a missão de não deixar que essas atitudes sejam feitas pelos nossos filhos, irmãos e sobrinhos. É por isso que “Jeremias - Pele” é tão importante. Mesmo que fale sobre racismo ainda
sem toda a intensidade desejada, pelo alcance que tem poderá entrar na vida de
milhares de jovens no momento certo, antes que o preconceito chegue e fique
enraizado para o resto da vida.
Nota: 9,5
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