segunda-feira, 18 de junho de 2018

Quadrinhos: "Deuses Americanos - Sombras", "Cadafalso" e "Jeremias - Pele"


“Deuses Americanos” é provavelmente o melhor livro de Neil Gaiman. Entre tantos que o consagrado autor já fez é o que mais se destaca. Lançado originalmente em 2001, ganhou uma excelente adaptação em formato de série televisiva (está disponível na Amazon Prime Video) e agora também se aventurou para os quadrinhos, seara que Gaiman domina como poucos e concebeu obras-primas. Publicada originalmente nos EUA pela Dark Horse, a Intrínseca lançou recentemente aqui o primeiro dos três volumes previstos chamado “Sombras”. Com 264 páginas em formato 17x26cm, a obra tem tradução de Fernando Scheibe e Leonardo Alves e apresenta diversos extras como esboços e capas alternativas que dão um plus e tanto. A adaptação ficou sob a responsabilidade de P. Craig Russell (Doutor Estranho) e Scott Hampton (Sandman) que nesse primeiro arco trazem Shadow Moon saindo da prisão e tendo que lidar com a morte da esposa e o encontro com o misterioso Wednesday que o insere em uma misteriosa guerra travada entre os deuses antigos das mitologias de cada país que chegaram aos EUA através dos imigrantes e os novos deuses dos dias atuais (como internet, mídia, etc.). Com algumas mudanças sutis no texto e na formatação, essa nova investida fica bem abaixo do esperado para quem já conhece a obra (seja do livro ou série), devendo funcionar melhor para os neófitos.

Nota: 6,0



“Composto no ano de 2017, durante a longa noite que se abateu sobre o país, período de vigência do golpe de agosto de 2016. Ainda que não verse sobre ele, sua sombra pode ser notada em todo o canto”. É o que escreve Alcimar Frazão no final do novo trabalho “Cadafalso” e realmente percebemos que essa sombra permeia tudo. Com 128 páginas, formato grande (21x27cm) e uma edição caprichada da editora Mino, o quadrinista viaja por Florença, Barcelona, São Paulo e Porto Alegre em anos e épocas distintas em contos que tratam da vida, do existir e dos absurdos que circundam isso. A arte em preto e branco alcança níveis ainda mais elevados do que em “O Diabo e Eu”, obra anterior do autor, e os contos trazem parcerias com nomes como Lourenço Mutarelli, Magno Costa e Dalton Cara. Do artista renascentista obcecado com a própria arte e religião, passando pelo motoboy que corre sem parar pela capital paulista, temos histórias que não são fáceis, carregam um cunho existencial, às vezes com poucas palavras e em outras usando projeções mentais, mas sempre com o impacto poderoso da arte. A história final que traz um velho recluso, cheio de delírios de grandeza e paranoia carregando dentro de si um moralismo demasiado e nocivo é a cereja do bolo de um álbum pesado e vigoroso.

Nota: 8,5


Jeremias é um raro personagem negro dentro do mundo concebido por Mauricio de Sousa. Estreou em 1960 e desde então tem sido mero coadjuvante nas histórias da turminha, encabeçando poucas aventuras solo nesses anos. Isso muda com “Jeremias - Pele”, mais um trabalho dentro do projeto Graphic MSP (o 18º) desta vez comandado por Rafael Calça e Jefferson Costa, e, talvez, o mais importante até agora. Com 98 páginas e publicação pela Panini Comics, os autores apresentam o protagonista no convívio com a família e na sua escola, onde depois de um dever sobre profissões encaminhado de maneira desastrosa pela professora, começa a sofrer preconceito mais severamente, por mais que este sempre estivesse presente ao redor. O texto insere situações cotidianas que os autores já passaram ou presenciaram na escola, no trabalho, na esquina, na rua. Situações que também vimos quando crianças - em maior ou menor escala - e temos a missão de não deixar que essas atitudes sejam feitas pelos nossos filhos, irmãos e sobrinhos. É por isso que “Jeremias - Pele” é tão importante. Mesmo que fale sobre racismo ainda sem toda a intensidade desejada, pelo alcance que tem poderá entrar na vida de milhares de jovens no momento certo, antes que o preconceito chegue e fique enraizado para o resto da vida.

Nota: 9,5




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