Ano: 1983. Local: Hawkins, uma
pacata cidade dos Estados Unidos sem muita coisa diferente de tantas outras
iguais espalhadas pelo país. Hormônios em ebulição nos adolescentes, crianças
brincando de RPG e lendo quadrinhos, pais querendo ter o mínimo possível de
mudança na vida, nada muito longe do comum e rotineiro. A única situação
distinta é que nos arredores da cidade, perto de uma grande floresta há uma
instalação governamental que supostamente tem como foco o trabalho com energia.
Supostamente.
Dia 15 de julho estreou no
Netflix a série “Stranger Things”
idealizada e concebida pelos irmãos Ross e Matt Duffer, os Duffer Brothers. Os
8 episódios dessa primeira temporada (ainda não há confirmação de uma segunda,
mas provavelmente acontecerá) caíram no gosto de milhares de espectadores e o
boca a boca em cima da produção, fez só crescer mais o interesse. Ou seja,
virou hype de uma hora para outra. Os criadores, apaixonados pelos anos 80,
fizeram um trabalho alinhado com o que acontecia na época não só do lado cultural,
mas do lado político e social.
Olhar para os anos 80 com
nostalgia não é algo intrínseco somente aos irmãos Duffer. Tanto no cinema,
quanto em outras searas, vez ou outra aparece alguma obra que se inspire na
época. Exemplos recentes disso são o ótimo filme “Super 8” de J.J. Abrams de
2011 ou o livro “Jogador No. 1” de Ernest Cline. A trama tem início quando o
jovem Will Byers (Noah Schnapp) some misteriosamente a caminho de casa depois
de uma partida de RPG com os amigos e enquanto a cidade inteira se posiciona na
busca pequenos mistérios vão pingando aqui e ali, dando a deixa para os
criadores usarem vastas referências.
A lista de referências é tão
extensa que algumas não se consegue pescar logo de saída. Lá estão
desde filmes leves como “Os Goonies”, “E.T - o Extraterrestre” e “Conta Comigo”
a outros de terror e ficção científica como “Alien, o 8º Passageiro” e “Poltergeist”.
A trilha sonora é outra grande sacada, mesmo tendo uma baba ou outra no meio como
Toto e Foreigner, enfileira sons de Joy Division, The Smiths, Echo And The Bunnymen, The Clash e David
Bowie. Inclusive, uma das boas falas é quando Jonathan Byers (Charlie
Helton) fala para o irmão que essas músicas podem mudar a vida dele (lembrou
de “Hora de Voltar”?).
Pelo hype em cima da série engana-se
quem pensa que ela seja somente um pastiche saudosista e prazeroso, ou ainda
resida somente nas homenagens dos criadores para obras que tenham afinco. “Stranger Things” se sustenta acima
disso. Claro que essas correlações são importantes e geram discussões pela
internet, aumentando o interesse, contudo mesmo se deixarmos essas questões de
lado temos uma série muito superior à média nessa primeira temporada, mesclando
humor, terror, fantasia, aventura e suspense de modo singular.
Os blocos separados funcionam sozinhos
ou em função do todo. Temos o trio de garotos que acha a garota especial, temos
os irmãos mais velhos passando pela adolescência e tudo que isso acarreta,
temos o xerife angustiado que vê o passado lhe assombrar, temos a mãe a flor da
pele que vê o mundo ruir ainda mais do que imaginava, além de outros focos
menores. Todos, sem exceção, não apresentam excessos que deixe a trama insossa,
ainda mais com as exuberantes interpretações para Joyce Byers (Winona Ryder),
Eleven (Millie Bobby Brown) e Dustin Henderson (Gaten Matarazzo).
Na sequência de acertos que o
Netflix vem enfileirando um atrás do outro, talvez “Stranger Things” seja o maior. Série razoavelmente curta, que assim
não tem episódios para encher linguiça ou passagens demasiadamente arrastadas,
e, ponto principal, com potencial para agradar todo e qualquer tipo de público.
De criança a velho, passando por adolescentes e jovens adultos, homem ou
mulher, alienado ou crítico, moderninho ou velho nerd. “Stranger Things” crava a Netflix como a grande casa das boas séries
atuais e, mais importante que isso, mostra que qualidade e aceitação pública
podem sim andar de mãos dadas.
Nota: 9,5
Textos relacionados no blog:
Cinema: “Super 8” (2011)
Literatura: “O Jogador No. 1” –Ernest Cline
Assista a um trailer legendado:
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