Riad Sattouf é filho de uma
francesa e um sírio. Seus pais se conheceram no início dos anos 70 quando
faziam faculdade na Sorbonne em Paris. Em 1978, Riad nasceu e logo depois o pai
aceitou um trabalho como professor na universidade de Trípoli na Líbia e para
lá se mandou com a família. É dessa partida que nasce a graphic novel “O Árabe do Futuro – Uma juventude no Oriente Médio (1978-1984)” (L’Arabe
du Futur: Une jeunesse au Moyen-Orient, no original), que a Editora
Intrínseca publica no Brasil agora em 2015 com 160 páginas e tradução de Debora
Fleck. Nela o autor relembra a infância vivida na França e na Líbia, como na
Síria para onde a família também foi por causa do trabalho do pai. O pai,
aliás, talvez seja a principal figura da obra. Culto, com título de Doutor no
currículo e adepto da teoria de que os árabes deveriam estudar muito para assim
poder fugir do obscurantismo da religião e almejar um futuro melhor (daí vem o
título), contrastava isso com uma ingenuidade demasiada no que tange as
questões do oriente. O choque é constante na hq e dá o tom da obra. Tanto de
ambiente pois contrasta a França com rascunho socialista de François Miterrand
contra a ditadura de Muamar Kadafi na Líbia e Hafez Al-Assad na Síria, quanto
comportamental nos costumes díspares e na formatação das duas famílias, com
destaques para as avós. O autor que além de quadrinhista é escritor e cineasta
tendo publicado vários livros e realizado dois filmes, além de ser colaborador
da revista Charlie Hebdo, resolveu cavar as lembranças pessoais depois da
guerra civil eclodida na Síria em 2011 e nas consequências geradas por isso
para os familiares de lá. “Árabe do
Futuro” é um álbum que explora muito o humor do estranho, do diverso,
repassando ao leitor a sensação de como seria para uma criança passear nesses
mundos. Exibe também uma arte forte com opção de cores direcionadas a cada
tópico e um trabalho primoroso no que tange a feições, além de tratar com
destreza situações complexas que vem assombrando o mundo nos últimos anos.
Nota: 8,0
Leia um trecho, aqui.
O projeto Graphic MSP já chega ao
décimo livro, o quarto somente esse ano. O que começou com “Astronauta Magnetar”
lá no final de 2012 desembarca agora em “Louco
– Fuga”, sempre mantendo um altíssimo nível de qualidade e deslizando
apenas em “Pavor Espaciar” do Chico Bento. Licurgo Orival Umbelino Cafiaspirino
de Oliveira, o Louco, é um dos personagens mais lado B de Mauricio de Sousa,
tão lado B que foi criado pelo irmão Marcio Araújo em 1973. Em épocas tão difíceis
para a arte no país trazia no peito essa ideia de liberdade, ainda que de
maneira subliminar. Coube a Rogério Coelho, premiado ilustrador de mão cheia,
apresentar o personagem dentro do projeto, sendo que foi ele quem se candidatou
e quis fazer uma história em cima de tão excêntrica e exuberante figura. Com o
auxílio de Francis Ortolan nas cores e a influência do artista inglês Dave
Mckean de “Sandman” na cabeça, Rogério conseguiu uma obra que é um vislumbre
visual absoluto. Com 84 páginas e lançamento pela Panini Comics, “Louco – Fuga” pode não ser a melhor hq
feita até agora nessa revisitação, mas sem dúvida é aquela com arte mais
encantadora. O roteiro inicia com o protagonista ainda criança quando solta um
pássaro preso pelos Guardiões do Silêncio (os vilões da trama) que tem como
objetivo calar todo o canto e alegria do mundo, tosar a criatividade geral e
imprimir a aceitação como moeda única. Reforçando as alegorias de liberdade do
personagem, o autor utiliza de metalinguagem para contar uma história surreal
que viaja no tempo e deixa no ar a sensação de incerteza, de crível, de
realidade, ao mesmo tempo em que se alinha com a fantasia, o sonho, o devaneio.
Para reforçar essas ideias não se utiliza daquela ordem normal dos quadrinhos,
os quadros em “Louco – Fuga” se
unem, mesclam, quebram, mudam de tamanho e atravessam entre si. Com o auxílio mágico
da turminha como coadjuvante, temos um álbum respeitável no quesito da fantasia
e belíssimo na parte dos desenhos, das cores e da montagem.
Nota: 9,0
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