O cidadão tem 26 anos e ainda está
sem rumo na vida. Já se dedicou a diversas coisas, porém, nunca foi muito longe
em nenhuma delas. Apesar de uma inteligência de bom nível, essa falta de
empenho, sejamos honestos, não conta muito pontos. O que é pior, ele não está
muito preocupado com isso, pelo contrário. Até o dia em que sua mulher resolve fugir
com outro cara. Bom, aí a coisa muda de figura e se faz necessário mexer o
corpo para recuperar o amor perdido (nem tanto) e principalmente o carro utilizado
para a fuga (um amado Ford Torino) e os cartões de crédito.
O carinha descrito acima é Ray
Midge, personagem principal de “O Cão do
Sul” (The Dog of The South, no original), livro do escritor estadunidense Charles Portis, famoso por “Bravura
Indômita” de 1968, que gerou duas excelentes adaptações cinematográficas (uma
em 1969 com John Wayne no papel principal e outra em 2010 com Jeff Bridges
nessa posição). Lançado nos Estados Unidos em 1979, só agora esse pequeno
clássico cult, ganha edição nacional através do selo Alfaguara da Editora
Objetiva com 264 páginas e tradução de Renato Marques.
“O Cão do Sul” tem na essência a perseguição do protagonista atrás
da amada saindo de uma pequena cidade do Arkansas, passando pelo México e
terminando em Belize. Durante os quilômetros percorridos, o autor insere uma
vasta quantia de personagens desconexos e surreais, além de situações que
flertam com o absurdo e com a loucura, envolvendo todos os fatos em uma fina camada
de humor negro e acidez, não deixando de sacanear quase ninguém no livro, além
de atiçar conceitos fechados da cultura americana.
O próprio Ray Midge é um herói
improvável, pois por mais que sua causa seja justa (recuperar a mulher e o
carro), seus atos nem sempre são. De tendência conservadora e expondo frequentemente
opiniões racistas e xenofóbicas, mesmo que pareça fazer isso sem querer, contrapõe
isso com uma bondade guardada ali no coração que vez ou outra aflora fazendo o
tomar decisões de cunho caridoso, sem que ele também não entenda muito as
razões que o levaram a fazer isso.
Na história criada por Charles
Portis em “O Cão do Sul” os
personagens, via de regra, ou estão buscando alguma coisa (sem saber muito bem
o que) ou estão envolvidos em suas próprias maluquices (sem saber muito bem o
que estão fazendo). Em resumo, todos estão perdidos na América do final dos
anos 70, sem saber ao certo onde devem aplicar o tempo que lhes resta aqui no
mundo. É usando isso que o autor cria um livro não só engraçado e satírico, como
também um trabalho crítico de comportamentos sociais, com muito cinismo enxertado
na mistura.
Nota: 7,5
A Editora Objetiva disponibilizou um trecho gratuitamente para leitura, aqui.
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