Veja bem, você está gordo, tem
que emagrecer. Não é somente uma questão de saúde, mas você precisa se adequar
as normas e regras atuais da nossa sociedade. Você não vê as fotos no Facebook
ou no Instagram diariamente? Pessoas “treinando” loucamente em academias atrás
desse biotipo ideal. Ah, você tem que sair mais também. Ser mais social. Sorrir
para todos, mesmo quando não quer, faz parte do processo. E por fim, era bom
cortar o cabelo, fazer a barba diariamente e usar roupas melhores, uma camisa pólo cairá bem em você, e isso “com certeza” lhe ajudará a achar o caminho da
felicidade.
Pois é. Não tem mais saída. Temos
que ser felizes a todo custo, a toda hora e entrar no modus operandi da sociedade em geral, mesmo que você seja feliz do
seu jeito e que não esteja nem um pouco preocupado em entrar nessa corrida por
uma felicidade imaginada que ninguém sabe ao certo como é. Como bem ressaltou a
psicanalista Maria Rita Kehl em entrevista: “do
direito a felicidade, passou para a obrigação”, assunto também
frequentemente tratado pelo psicólogo Arnaldo Cheixas Dias no blog que mantêm
chamado “Em Terapia”.
A banda paraense Aeroplano
explora essa questão no seu segundo disco, que chega depois de dois EP’s e o
trabalho de 2011 intitulado “Voyage”. O novo rebento lançado nesse ano tem 10
faixas e, não por acaso, chama-se “Ditadura
da Felicidade”. Foi produzido pelo guitarrista Diego Fadul, masterizado por
Ivan Jangoux e conta com o (ótimo) projeto gráfico de Talitha Lobato. Se em “Voyage”
a banda concebeu coisas realmente boas como “Dorme”, “Estou Bem Mesmo Sem Você”
e “Vermelho que é Rosa”, por outro lado apresentou faixas confusas que não
diziam muita coisa e influenciavam negativamente no resultado final.
Isso felizmente não acontece em “Ditadura da Felicidade”. Eric
Alvarenga (vozes, violões e guitarras), Felipe Dantas (bateria, percussão e vocais),
Bruno Almeida (baixo), Erik Lopes (guitarras) e Diego Fadul (guitarras,
teclados e vocais) são responsáveis por um disco coeso que equilibra de bom
modo as melodias e o trabalho instrumental, tendo como um belo destaque as
letras pequenas mas certeiras (todas de Eric Alvarenga, com exceção de “11” de
Diego Fadul). O trabalho das guitarras flui muito bem como podemos perceber na
ótima “Bazar” e na estupenda faixa que abre o trabalho e traz os versos: “essa é a ditadura da felicidade, todo mundo
sorrindo mesmo sem vontade”.
Além da faixa título outras
merecem realce. “Drogaditos”, por exemplo, é uma sacada precisa e pop até a
medula que fala sobre drogas legais usadas no dia a dia como Dorflex, Tandrilax
e Dramin, que servem para lidar com a dor, para dormir melhor ou para forjar
uma tranquilidade. “Blasé” é outra
pequena pérola. Destroça toda a pretensão cult de determinados indivíduos que
acham que tem resposta para tudo concluindo que: “meu amigo cult vai ensinar ao mundo como ser alguém diferenciado”.
“11” é mais uma que se sobressai com uma tristeza arrebatadora e a constatação
de uma geração desnorteada que não sabe muito bem para onde quer ir.
“Ditadura da Felicidade” mostra uma banda que cresceu de modo assustador
entre um trabalho e outro, e que passou de bons lampejos para uma produção mais
homogênea. Em pouco mais de meia hora o álbum é uma sucessão de acertos tanto
nas faixas mais enérgicas, quanto nas mais lentas, assim como na questão dos
assuntos abordados nas letras. Com um pé no indie rock dos anos 2000 e outro em
bandas como Violins, Radiohead e até mesmo Wilco, “Ditadura
da Felicidade” é um dos melhores discos nacionais de 2014 até agora. É um disco
para se ouvir feliz, triste, alegre ou deprimido. Você que escolhe. Nele não há
ditadura alguma embutida.
Nota: 8,5
O disco está disponível para
download gratuito no site da banda: http://www.aeroplano.mus.br
Facebook: http://www.facebook.com/aeroplanorock
Soundcloud: http://soundcloud.com/aeroplano
P.S: Essa tirinha do Malvados também
trata dessa questão da ditadura da felicidade e suas reações:
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