“A música jazz é uma inquietação acelerada”, assim apontou a
falecida escritora francesa Françoise Sagan de “Bom Dia Tristeza”. Essa
inquietude é presente não somente na formatação dos improvisos feitos em cima
de cada frase de um instrumento ou na construção de arranjos sofisticados e
únicos, como também pode ser transferida para a vida da maioria dos músicos que
criaram e consolidaram o gênero em suas vertentes mais ricas e poderosas.
O romancista e ensaísta inglês Geoff
Dyer é um dos muitos amantes do estilo e em 1991 lançou um livro sobre o tema
chamado “But Beatiful: A Book About Jazz”. Essa obra ganhou reimpressão em
terras nacionais no ano passado pela Companhia das Letras com 240 páginas e
tradução de Donald M. Garschagen. O autor que tem livros sobre diversas outras
áreas como fotografia e viagens, exibe aqui amplo conhecimento e uma paixão
expressiva sobre o tema.
“Todo Aquele Jazz” é um livro de ficção que toma como embasamento de
criação alguns fatos reais da vida dos músicos retratados. Usa como matéria-prima
inicial fotografias antigas que o autor teve acesso ou já conhecia, e a partir
disso passou a imaginar aspectos mais extensos. Ícones do jazz são retratados
em cada capítulo, como Thelonious Monk, Charles Mingus, Chet Baker, Lester
Young, Bud Powell, Art Pepper e Ben Webster, além do extraordinário Duke Ellington
permeando todos esses capítulos em passagens curtas.
As histórias que Geoff Dyer
fabrica são permeadas por dores, decepções, passividade e uma melancolia
diretamente vinculada aos tempos áureos em que o brilhantismo e a energia ainda
eram as moedas correntes dessas vidas. Não obstante, esse reflexo espelhado que
ele exibe nas páginas vem justamente depois da absorção das inovações do ritmo,
assim como naquilo que sempre teve em volta do jazz na maioria das vezes como o
álcool, as drogas e as mulheres.
A viagem invade os anos 20 e
chega até os anos em que esses baluartes mantiveram sua existência, isso de
modo sucinto, sempre se apegando ou ao momento de declínio físico, mental e
criativo, ou de ostracismo em algum país longe da América. Essa viagem mesmo
sendo pesarosa e triste em determinadas situações não deixa de ser idílica e
poética em diversas outras passagens, devido principalmente a sapiência do
autor e a maneira como escreve.
De todos os capítulos, aqueles
que focam em Thelonious Monk, Charles Mingus e Art Pepper são os mais
exuberantes. Magia, loucura e incompreensão andam de mãos dadas nesses pequenos
contos. Para envolver ainda mais o leitor as fotos comentadas nas páginas do
livro poderiam estar presentes. Porém, isso é mero detalhe e “Todo Aquele Jazz” ainda encerra com um
ensaio formidável justamente sobre o estilo de vida que os músicos levavam (por
opção própria ou não) e sua contraposição na criação de pequenos clássicos,
além de uma estupenda discografia selecionada para correr atrás depois.
Nota: 9,0
A editora disponibiliza um trecho
gratuito para visualização, aqui.
Textos relacionados no blog:
- Literatura: “Pops – A Vida de Louis Armstrong”
– Terry Teachout
- Literatura: “Kind Of Blue – Miles Davis e o álbum que reinventou a música moderna” – Richard Williams
- Quadrinhos: “Bourbon Street –Os Fantasmas de Cornelius” – Philippe Charlot e Alexis Chabert
Essa é a única foto que está no livro e mostra Ben Webster,
Red Allen e Pee Wee Russell.
Nenhum comentário:
Postar um comentário