Em 2009, o escritor australiano
Max Barry estava com um indesejado bloqueio criativo. Nada que ele começava a
escrever conseguia se desenvolver. Ideias iam para a lixeira, roteiros de
filmes não eram lidos e manuscritos entravam em gavetas para nunca mais ver
alguma luz. Foi quando resolveu postar pedaços de uma nova história chamada
“Homem-máquina” no seu site. A coisa
foi fluindo, gerou interesse e recebeu vários pitacos de leitores que foram
considerados no decorrer da trama.
A investida deu tão certo que em
2011 “Homem-máquina” ganhou edição física lá fora (com várias diferenças em
relação a versão online) e no ano passado a Editora Intrínseca publicou aqui no
Brasil. Com 288 páginas e tradução de Fábio Fernandes é o terceiro dos quatro
livros do escritor a ser lançado em terras brazucas (os outros são “A Companhia”
e “Eu S/a”). Nele, o autor cria um romance que usa a ficção científica como
base em paralelo com um bem-humorado thriller de conspiração.
O personagem principal é o Doutor
Charles Neumann, um engenheiro que trabalha na conceituada empresa de ciências
Futuro Melhor. Na verdade, ele não sabe muito bem o que constrói na empresa e
nem onde essas invenções são aplicadas. Mas, isso não o impede de ter uma
posição de destaque dentro do laboratório que mais parece uma prisão. Sem
qualquer vestígio de vida social, ou seja, sem nenhum amigo, contato com
família ou namorada, tem como companheiro o moderno celular.
É esse celular que em uma
passagem inicial divertidíssima leva ao acidente de trabalho que lhe custa uma
das pernas. Ao invés de olhar para isso como uma tragédia, o Dr. Neumann vê uma
grande janela de oportunidades a partir do envolvimento da especialista em
próteses Lola Shanks. Fascinado por máquinas e pela ideia de aprimoramento
contínuo, ele dá partida a uma busca tresloucada e sem limites pela perfeição,
pela ideia de um corpo funcionando com partes melhores e menos frágeis.
É meio óbvio que essa busca vai
resultar em um tremendo desastre. Como afirmava o filósofo francês Voltaire, “toda perfeição é um defeito” e isso
fica bastante claro para o leitor, mesmo que para o Dr. Neumann isso não seja
assim tão visível. Enquanto encaminha seu personagem para um destino
praticamente sem retorno, Max Barry faz uma zombaria inteligente sobre o apego
exercido nos nossos tempos com a tecnologia, o que gera vícios e neuroses e
resulta em pensamentos malucos de poder e necessidade.
Na segunda metade, “Homem-máquina” amplifica essas
neuroses e é conduzido por outros caminhos, como a relação entre o personagem
principal e os interesses da empresa com um olhar mais focado na área militar
governamental para as invenções que vão surgindo. O escritor ítalo-americano
Felice Buscaglia dizia que a “ideia da
perfeição o assustava”, já para Max Barry a caça por essa perfeição gerou
um livro interessantíssimo, que consegue ser crítico e divertido ao mesmo
tempo.
Tem uma pequena parte inicial para leitura (em inglês) aqui.
Nota: 8,5
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