domingo, 19 de agosto de 2012

"Diomedes - A Trilogia do Acidente" - Lourenço Mutarelli

.

O mundo que Lourenço Mutarelli imaginou para adequar o detetive Diomedes é ordinário e sem graça, mas ao mesmo tempo transita na esfera imediatamente contrária a tudo isso. O delegado aposentado que tira onda de detetive para ganhar alguns trocados a mais para bancar seus pequenos vícios, trafega no meio de pessoas estranhas e se mete em enrascadas que não consegue entender ao certo, mas nutre desejos simples e banais como apenas sobreviver.

A história começou a ser elaborada em meados de março de 1997 e ganhou o corpo de uma trilogia pelas mãos da editora Devir no final dos anos 90 e começo dos 2000, sendo que a última parte intitulada “A Soma de Tudo” foi dividida em dois volumes (o que fez a trilogia ter quatro volumes). Agora em 2012 a Companhia das Letras teve a grande ideia de reunir tudo isso, mais esboços e tiras inéditas em um compêndio de 432 páginas em formato grande (18.70 x 27.50cm).

“Diomedes - A Trilogia do Acidente” é antes de tudo um álbum dedicado ao pai de Mutarelli que também era delegado e amante dos quadrinhos, mas que faleceu em 2001 e não viu a obra completa. Em uma emocionante nota no final, o autor afirma inclusive “que todas as piadas que Diomedes conta me foram contadas por meu pai”. E é entre homenagens e experimentações fora das exploradas normalmente que o autor criou um personagem singular e incrível.

Toda desenhada e com diálogos em preto e branco, com boas doses de sujeira e noir nos traços e um leve apreço por “Sin City” do Frank Miller, a história tem como protagonista um detetive gordo, desengonçado e que não apresenta nenhum caso resolvido na carreira. Com um jeito peculiar e repleto de tiradas, esse quase fracassado vai conquistando o leitor passo a passo enquanto tem a vida atravessada pela mulher, leões, policiais e uma magia com alto grau de mistério.

Os dois primeiros arcos são os melhores. “O Dobro de Cinco” e “O Rei do Ponto” quebram os clichês policiais enquanto os utilizam para servir como guias. Já “A Soma de Tudo” é mais viajandão e manda Diomedes para uma missão meio maluca em Lisboa onde Mutarelli aproveita para homenagear ícones dos quadrinhos (como Jack Kirb, Stan Lee, Will Eisner e Hergé, entre outros), enquanto desfila sua verve irônica, caótica e politicamente incorreta pelos quadros.

Nota: 8,5

A Companhia das Letras disponibiliza um trecho para leitura gratuita, aqui.

Matérias relacionadas no blog:


sábado, 18 de agosto de 2012

"À Beira do Caminho" - 2012


Um olhar carrancudo e sem muita paciência. Um caminhão que rasga estradas mal feitas no interior do país. “A Distância” do Roberto Carlos tocando como trilha sonora ao fundo. É assim que o diretor Breno Silveira de “2 Filhos de Francisco” apresenta João, o caminhoneiro que é o personagem principal do filme “À Beira do Caminho” que estreou recentemente nos cinemas de todo o país.

O filme traz o excelente ator João Miguel (de “Estomâgo” e “Xingu”) no papel desse caminhoneiro amargurado e com fantasmas espalhados por todo o lugar. Abalizado por canções do Rei, oferece ao telespectador uma história de medo, culpa e reencontro não somente com si mesmo, mas também com o mundo a sua volta. A mão do diretor apresenta ótimas cartas para serem jogadas.

Ao jogar essas cartas é que o diretor Breno Silveira dá uma escorregada. A trilha sonora com canções conhecidas e que estão no DNA da população nacional é garantida e rende ótimos frutos, auxiliada pela trilha sonora original composta por Berna Ceppas. A fotografia dirigida por Lula Carvalho também acerta ao mostrar o Brasil do modo como é, com suas belezas e fraquezas tão peculiares e paradoxais.

No entanto, a partir do momento em que o solitário caminhoneiro vê a sua estrada atravessada por um garoto (o estreante Vínicius Nascimento) que anseia ir para São Paulo conhecer o pai que nunca viu, é que alguns deslizes são cometidos e tiram a potência que o longa poderia alcançar. O roteiro de Patrícia Andrade esbarra em frases óbvias (principalmente do garoto) e soluções novelescas.

Esses deslizes não transformam “À Beira do Caminho” em um filme ruim, pois ver alguém perdido se reencontrar é reconfortante, assim como extrair bondade sempre emociona. Porém, ao optar por uma maior facilidade de entrega retira-se da obra uma parte relevante, podendo ser definida assim com uma das frases mostradas nos pára-choques dos veículos do longa: “espere o melhor, prepare-se para o pior e aceite o que vier”.

Nota: 7,0

Assista ao trailer: 

sexta-feira, 17 de agosto de 2012

"Batman - O Cavaleiro Das Trevas Ressurge" - 2012


O poder de um símbolo. O poder de uma palavra que em uma definição ampla pode ser compreendida como um elemento representativo evidente que por analogia substitui um objeto, conceito, ideia ou qualidade. Ou ainda pode servir como definição, apoio ou emblema que determine ações de indivíduos e da sociedade em termos gerais. É apoiado na percepção de um símbolo que Christopher Nolan resolveu terminar sua trilogia sobre o Batman.

“Batman: O Cavaleiro das Trevas Ressurge” carregava uma incumbência pesada no quesito expectativa, devido ao fato dos dois filmes anteriores - de 2005 e 2008 - terem sido exemplares, redefinindo com maestria toda a história do morcego na grande tela, assim como ter sido capaz de inserir debates além da esfera do mundo de um super-herói. Dar um final digno para essa trilogia e manter o nível era uma tarefa que não transportava em si nada de simples.

O novo longa é situado oito anos após o fim de “Batman: O Cavaleiro das Trevas”, onde a cidade de Gotham consegue sobreviver a toda insanidade do Coringa interpretado brilhantemente pelo falecido Heath Ledger. Mas, essa sobrevivência custou caro. O preço foi a honra e a vida do promotor Harvey Dent, além do sumiço do herói encapuzado retratado como vilão para que a população tivesse no promotor assassinado um símbolo plausível de verdade e justiça.

A Gotham depois desse tempo é uma cidade onde o crime quase não tem lugar, uma vez que o governo impetrou ordem devido a uma lei conflituosa no que tange aos direitos civis. O reflexo disso é que o Batman é visto mais como uma lenda urbana e o Comissário Gordon (Gary Oldman) precisa conviver com o fato de ser o único que sabe realmente a verdade. Nesse cenário é que Bane (Tom Hardy) começa a desenvolver um plano para sitiar a cidade.

O Bane de Nolan está a quilômetros de distância da qualidade sofrível do personagem que apareceu no fatídico “Batman e Robin” de 1997, no entanto incomoda um pouco pela sua postura classicamente extrema de um vilão falastrão. Essa tendência a falar demais não se assemelha tanto com a imagem criada nos quadrinhos (“A Queda do Morcego”, principalmente), mas por outro lado acaba rendendo surpresas na própria humanidade do quase imbatível assassino.

Mantendo personagens anteriores como o Alfred de Michael Caine e o Lucius Fox de Morgan Freeman, o diretor insere novos como o policial John Blake (Joseph Gordon-Levitt), a filantropa Miranda Tate (Marion Cotillard) e a nova encarnação da Mulher-Gato vivida pela bela Anne Hathaway, que mesmo ainda não sendo párea para Michelle Pfeiffer, obtém um resultado convincente. No mais, Christian Bale enverga novamente com intensidade a capa e a máscara.

Com a cidade ameaçada pelos desmandos de Bane e com o perigo veemente de uma criação sua se voltar para destruir tudo, Batman necessita não somente recuperar os baques físicos a que foi infligido como também se superar e servir como a inspiração que tanto reluta em apresentar. E é quando o mundo oferece uma quantia muito mais extrema de trevas e desconfiança que Nolan e Bale trazem magistralmente o seu cavaleiro armado e pronto para a sua última e derradeira luta.

Nota: 8,5

Matérias relacionadas no blog:

- DVD: “Batman – Ano Um” (2011).
- Quadrinhos: “Coringa”.

Assista ao trailer: