O mundo que Lourenço Mutarelli
imaginou para adequar o detetive Diomedes é ordinário e sem graça, mas ao mesmo
tempo transita na esfera imediatamente contrária a tudo isso. O delegado
aposentado que tira onda de detetive para ganhar alguns trocados a mais para
bancar seus pequenos vícios, trafega no meio de pessoas estranhas e se mete em
enrascadas que não consegue entender ao certo, mas nutre desejos simples e
banais como apenas sobreviver.
A história começou a ser
elaborada em meados de março de 1997 e ganhou o corpo de uma trilogia pelas
mãos da editora Devir no final dos anos 90 e começo dos 2000, sendo que a
última parte intitulada “A Soma de Tudo” foi dividida em dois volumes (o que
fez a trilogia ter quatro volumes). Agora em 2012 a Companhia das Letras teve a
grande ideia de reunir tudo isso, mais esboços e tiras inéditas em um compêndio
de 432 páginas em formato grande (18.70 x 27.50cm).
“Diomedes - A Trilogia do Acidente” é antes de tudo um álbum
dedicado ao pai de Mutarelli que também era delegado e amante dos quadrinhos,
mas que faleceu em 2001 e não viu a obra completa. Em uma emocionante nota no
final, o autor afirma inclusive “que todas as piadas que Diomedes conta me
foram contadas por meu pai”. E é entre homenagens e experimentações fora das
exploradas normalmente que o autor criou um personagem singular e incrível.
Toda desenhada e com diálogos em preto
e branco, com boas doses de sujeira e noir nos traços e um leve apreço por “Sin
City” do Frank Miller, a história tem como protagonista um detetive gordo,
desengonçado e que não apresenta nenhum caso resolvido na carreira. Com um
jeito peculiar e repleto de tiradas, esse quase fracassado vai conquistando o
leitor passo a passo enquanto tem a vida atravessada pela mulher, leões,
policiais e uma magia com alto grau de mistério.
Os dois primeiros arcos são os
melhores. “O Dobro de Cinco” e “O Rei do Ponto” quebram os clichês policiais
enquanto os utilizam para servir como guias. Já “A Soma de Tudo” é mais
viajandão e manda Diomedes para uma missão meio maluca em Lisboa onde Mutarelli
aproveita para homenagear ícones dos quadrinhos (como Jack Kirb, Stan Lee, Will
Eisner e Hergé, entre outros), enquanto desfila sua verve irônica, caótica e
politicamente incorreta pelos quadros.
Nota: 8,5
A Companhia das Letras
disponibiliza um trecho para leitura gratuita, aqui.
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