Um ex-militar (mas pode ser ex-policial ou uma pessoa comum) vê sua vizinhança se degradar, com gangues de jovens comandando brutalidades habituais. Um grande amigo (mas pode ser uma esposa, uma filha ou alguém próximo) é assassinado com extrema violência e então a pessoa que antes assistia a tudo passivamente, resolve fazer justiça com as próprias mãos. Roteiro batidaço né? Digno de um clássico a ser protagonizado pelo Steven Seagal.
Assim é o roteiro de “Harry Brown”, filme londrino do ano passado que chega diretamente em DVD por aqui. A primeira vista é o típico do filme para correr bem longe, ou só assistir naquelas madrugadas de insônia. Mas não é caso. Por qual motivo? Principalmente por conta do responsável pelo papel principal, mais especificamente o grande Michael Caine, que já se meteu em algumas furadas sim, por trabalhar demais, mas ainda é um grandíssimo ator.
Aos 78 anos, Michael Caine vive o ex-fuzileiro que dá nome ao filme dirigido por Daniel Barber. O roteiro apesar de óbvio e repleto de possíveis lugares comuns, consegue dá uma boa fugida do banalismo fácil. O Harry Brown que vemos passa distante de um Charles Bronson em um dos filmes da série (clássica ao seu jeito) “Desejo de Matar”, por exemplo. Seu universo é real e a maneira que as coisas se sobrepõem para levar a vingança até se justifica.
O Harry Brown de Caine não sai simplesmente atirando em todo mundo no meio da rua como um jovem herói. Pelo contrário, ao correr atrás de um dos alvos da sua proposta vingança quase tem um infarto e despenca no chão semimorto. O diretor Daniel Barber coloca também a serviço do longa, uma fotografia suja e destratada e não segura a mão na violência das cenas. Drogas, perversão e crimes gratuitos. A mesa fica farta para as escolhas serem feitas.
É claro que não é um filmaço, um trabalho para ser vangloriado aos quatro cantos (apesar de ter recebido críticas bem positivas no Reino Unido), mas merece um lugar nas salas de exibição mais do que muita bomba por aí. Michael Caine é um ator soberbo, daqueles que tem o dom de carregar sozinho qualquer produção, até onde as chances de erro eram imensas como em “Harry Brown”. E ele anda dizendo que vai parar. O cinema ficará um pouco menor.
terça-feira, 29 de junho de 2010
domingo, 27 de junho de 2010
"A Chuva Antes de Cair" - Jonathan Coe
O inglês de Birmingham, Jonathan Coe, já escreveu obras de extrema qualidade como o poderoso “O Legado da Família Winshaw” e o envolvente “Bem-Vindo Ao Clube”. A constituição familiar e seus segredos e mentiras sempre atraíram o escritor. O tema esteve presente de modo constante nas suas tramas. “A Chuva Antes de Cair”, seu último livro lançado no Brasil pela Editora Record no ano passado com 256 páginas, não foge a pequena regra.
O escritor volta seus olhos para contar uma história que atravessa gerações assim como em “O Legado da Família Winshaw”, só que desta vez sem tanto brilho ou humor. “A Chuva Antes de Cair” começa na segunda guerra mundial e desembarca nos dias de hoje, narrada em flashback. Quem faz a narração em fitas cassetes é Rosamond, que aos 73 anos espera a hora da própria morte. Sua missão é revelar para a jovem Imogen, tudo por trás da sua família.
Rosamond está sem contato com Imogen há vários anos, e passa a missão para sua sobrinha-neta Gill, que terá que encontrá-la e repassar as fitas. Só que Gill não consegue achar nenhum rastro e se entrega a curiosidade de conhecer os segredos, o que faz junto com suas duas filhas. Há uma excepcionalidade por trás de tudo. Imogen é cega, perdeu a visão aos 3 anos, e a forma que Rosamond encontra é descrever o que deseja através de 20 fotografias.
Jonathan Coe escreve bem, isso é inegável, e sabe utilizar isso para emoldurar seus livros. Em “A Chuva Antes de Cair” não é diferente. Constrói bem as épocas que vai ultrapassando e faz na figura de Rosamond, uma sutil crítica a solidão. No entanto, isso não é suficiente. Mesmo funcionando sua narrativa por uma mulher, não consegue deixar o leitor plenamente envolvido em nenhum momento, e acaba por disfarçar repetições de temas e rotinas.
Para quem não conhece seus livros anteriores, a chance de envolvimento é maior. Ao versar sobre amor e o famigerado entendimento do que é felicidade, temos um trabalho bem estruturado, basicamente triste e melancólico e com curtas doses de emoção. No entanto, quem já teve contato com sua obra tende a se decepcionar novamente, assim como em “A Casa do Sono”, outro livro mediano do autor, que parece que deixou seus melhores dias para trás.
sexta-feira, 25 de junho de 2010
“The ArchAndroid” - Janelle Monáe - 2010
Álbuns conceituais não são lá uma grande novidade na música pop. The Beatles, David Bowie, Pink Floyd e Prince, por exemplo, já se aventuraram com grande maestria por esse universo imaginário. Janelle Monáe também optou por esse caminho na sua estréia fonográfica com “The ArchAndroid”, lançado em maio deste ano. O disco da jovem de 24 anos nascida em Kansas City nos USA é muito bem vindo dentro do pop atual de nomes como Lady Gaga e Ke$ha.
“The ArchAndroid” narra as aventuras de Cindi Mayweatther, uma espécie de heroína cibernética que luta para libertar o povo reprimido de uma grande cidade. Na verdade é como se fosse uma continuação do seu primeiro EP lançado em 2007. Apadrinhada por Puff Daddy e Big Boi do Outkast, a cantora já foi indicada ao Grammy no ano passado. Sua música tem como alicerce o R&B dos anos 60 e 70 mas absorve também funk, rap, dance, folk, jazz e psicodelia.
São 68 minutos divididos em 18 faixas, o que acaba diminuindo um pouco o resultado final, visto que são poucos os artistas que conseguem brilhar inteiramente em discos tão longos. Duas suítes instrumentais e faixas como “Mushrooms & Roses” e “Wondaland” não fariam falta alguma. Nas demais, há certa divisão entre pop’s mais acelerados e músicas mais suaves. Da primeira parte destacam-se a ótima “Cold War”, “Tightrope” e “Come Alive (The War Of The Roses)”.
Pode-se destacar também a sessentista “Faster”, “Locked Inside” (influenciadíssima por Stevie Wonder) e “Make The Bus”, um dance psicodélico que lembra um pouco as brincadeiras do Apples In Stereo e tem participação do Of Montreal. Do lado mais lento do álbum brilham “Oh, Maker” e “57821” como folks antigos e com um leve toque de Velvet Underground e Nico pairando no ar. “BaBopByeYa” mistura jazz e temas de musicais no encerramento.
Janelle Monáe tem um evidente apelo de marketing que não pode ser desprezado, com seu estilo James Brown de dançar, o cabelo com um imenso topete e o modo de se vestir com ternos e smokings, quase sempre em preto e branco, mas também exibe qualidade na forma que caminha por cada uma das músicas. “The ArchAndroid” apesar de um pouco extenso, acerta em uns 80%, e é uma boa noticia no massacrado e clichê mundo do pop dessa iniciante década.
quarta-feira, 23 de junho de 2010
“O Dia em que James Brown Salvou a Pátria” - James Sullivan
“O Poderoso Chefão do Soul”. “Senhor Dinamite”. “O Irmão Número 1 do Soul”. “O Homem que Mais Trabalhou no Show Business”. Esses são apenas alguns dos apelidos que James Brown acumulou durante a carreira. Fundamental na música negra norte americana, levou o soul e o rhythm & blues para além dos seus limites, criou uma sonoridade própria (para muitos inventando o funk) e serve até hoje de influência para uma incontável gama de outros artistas.
Em 5 de abril de 1968, um dia após o assassinato de Martin Luther King, James Brown subia no palco do Boston Garden, com a missão de acalmar uma cidade prestes a estourar como tantas outras que explodiam naquele momento pelo país. Kevin White, o prefeito da cidade de Boston na época, mesmo a contragosto no inicio, armou uma estratégia para o show do cantor, incluindo transmissão ao vivo para toda a cidade, o que contribuiu para que os nervos se acalmassem.
O jornalista James Sullivan conta essa e outras histórias em “O Dia em que James Brown Salvou a Pátria”, lançamento desse ano da Editora Zahar com 200 páginas. Focado nesse show ímpar e em todo o clima de tensão que existia nas ruas dos U.S.A, o jornalista aproveita também para traçar um quadro geral da vida e obra do cantor, olhando diretamente para seu envolvimento na luta pelos direitos civis dos negros e na tentativa de construir um futuro melhor.
James Sullivan se apóia em diversos depoimentos de pessoas ligadas a James Brown para corroborar suas teses, disponibilizando uma considerável bibliografia no final. A maneira que ele escolhe para conduzir o trabalho é que às vezes é um pouco confusa pulando de um momento para outro sem que uma ponte de interligação seja feita. Seu tom apaixonado pelas canções e principalmente pela figura transcendental de James Brown, também pesa um pouco na balança.
James Brown, que sempre fez as coisas da sua maneira contrapondo na mesma proporção carisma e manipulação e falando o que bem queria inclusive a presidentes, teve com qualquer outro artista momentos de fama e outros de declínio, até falecer em 25 de Dezembro de 2006. “O Dia em que James Brown Salvou a Pátria” cumpre o intuito de mostrar esse dia em especial, além de servir como ponto de partida para conhecer a obra fantástica que o artista gerou.
domingo, 20 de junho de 2010
“Bang Goes The Knighthood” - The Divine Comedy - 2010
“Bang Goes The Knighthood” é o nome do novo disco do The Divine Comedy, banda - projeto do irlandês Neil Hannon. O décimo trabalho da carreira chega pela DC Records, depois que o contrato com a Parlaphone acabou em “Victory For The Comic Muse” de 2006. Após algumas aventuras com outros projetos, Neil Hannon retorna mostrando a habitual classe do seu pop repleto de melodias elaboradas e letras como se fossem pequenos contos.
“Down In The Street Below” abre o trabalho com mais de cinco minutos, solitária no piano para o vocal sempre bonito de Neil Hannon aparecer. Depois de um tempo, sinuosas orquestrações engrossam o instrumental de uma canção que fala sobre o cotidiano, sobre homens e mulheres que saem para seus trabalhos pensando em arrumar as coisas para o natal, mas também preocupados em não pisar em pombos ou esquecer de rezar para seus deuses.
As letras trazem aquele sarcasmo e ironia embutidos, com pequenas flechadas aqui e ali. “The Complete Banker”, por exemplo, satiriza os banqueiros que após a crise mundial deixaram seus Armanis e Bentleys para trás e pedem sem pudor: “Alguém pode me emprestar dez milhões de libras?” “Neapolitan Girl” e a faixa título são rapidinhas, com menos de três minutos, exemplos bem característicos das nuances que o Divine Comedy é capaz de prover.
“At The Indie Disco”, o primeiro single do disco é pop até a alma, lembrando um pouco “Something For The Weekend” do “Casanova” de 1996, o melhor álbum da carreira do The Divine Comedy. “At The Indie Disco” tem letra bem humorada sobre paixão e a música alternativa como pano de fundo, enumerando Morrisey, Blur e Pixies no meio da canção, dizendo que “ela faz meu coração bater da mesma maneira que no início de “Blue Monday”.
“Have You Ever Been In Love” é uma apaixonadíssima canção de amor. Neil Hannon pergunta: “Alguma vez já começaram a dançar no meio de um shopping? Alguma vez você já deu uma gargalhada por nenhuma razão? (...) Alguma vez você já se apaixonou?”. E aí? Já?. “Assume The Perpendicular” traz palmas e o piano em cima de uma harmonia exuberante. “The Lost Art Of Conversation” critica singularmente a falta de conversa no mundo atual.
A dobradinha de “Island Life” e “When A Man Cries” dá uma pequena e sutil queda na qualidade do disco, que sobe novamente com o ritmo de cabaré de “Can You Stand Upon One Leg”, que alfineta: “Você pode escrever uma canção idiota? É mais difícil do que você pensa.” Flashes de filmes antigos invadem a mente. Para fechar, temos a alegrinha “I Like” que poderia muito bem estar em qualquer disco de uma banda nova do indie pop atual.
“Bang Goes The Knighthood” não é espetacular, mas exibe qualidade suficiente para cravar um honroso quarto ou quinto lugar na discografia do The Divine Comedy, o que convenhamos não é tarefa simples. Neil Hannon continua mantendo a mesma sonoridade que envolve música clássica, pop dos anos 60, jazz, folk e música barroca em melodias magníficas exprimidas por variados instrumentos e barulhos peculiares. Que continue assim.
Site Oficial: http://www.thedivinecomedy.com
My Space: http://www.myspace.com/thedivinecomedy
sexta-feira, 18 de junho de 2010
"Toy Story 3" - 2010
Quando John Lasseter arremessou “Toy Story” nos cinemas em 1995 talvez não soubesse muito bem onde tudo ia dar. Fundador e gênio por trás da Pixar Animation Studios criou uma respeitabilíssima esteira de nove filmes que sucederam seu primeiro “Toy Story”. Conseguiu conciliar inovações técnicas, qualidade e sucesso de público e crítica. A franquia que iniciou tudo ganhou mais um longa em 1999 e agora em 2010 chega ao seu terceiro volume.
“Toy Story 3” carrega toda a maestria da Pixar. Novamente. Realmente não deveria ser novidade, mas ainda sim impressiona pela manutenção de nível. Com direção de Lee Unkrich e roteiro de Michael Arndt (indicado ao Oscar por “Pequena Miss Sunshine”), a animação dosa sensibilidade, aventura, suspense e emoção. Além dos personagens já tradicionais como o cowboy Woody e o policial espacial Buzz Lightyear, outros dão graça ao longa.
Andy (que para quem não sabe é o dono dos brinquedos) está com 17 anos, prestes a ir para a Universidade e outros planos começam a tomar conta da sua cabeça, com o caminhar da vida se apresentando. Não tem mais tempo nem vontade para brincar com seus queridos parceiros de inúmeras diversões na infância. Quando a partida é eminente ele precisa separar o que levará para a graduação, o que irá para o lixo e o que será guardado no sótão.
Seus brinquedos ficam tensos, não sabem onde vão parar e morrem de medo de ir para o lixo. Por conta de uma equívoco acabam parando em uma creche, na qual a primeira vista tudo é uma maravilha. Só Woody tenta voltar ao antigo dono. No entanto, a creche não é o que parece. O urso cor de rosa Lotso está no comando e toca o lugar com mão de ferro. Woody retorna para ajudar seus amigos a fugir e encontra algumas aventuras fantásticas pela frente.
“Toy Story 3” é um libelo bonito e envolvente sobre amizade e lealdade. Mesmo quando o mundo está para se acabar e a morte é iminente, esse testemunho é dado. É engraçado, tanto pelos velhos personagens (como o “Sr. Cabeça de Batata”) quanto pelos novos (como o “Ken”), e também é emocionante. Nos momentos finais é difícil não sentir um aperto no coração e pensar um pouco sobre a infância e sobre todos os amigos que ficaram para trás.
quarta-feira, 16 de junho de 2010
"Retrato do Artista Quando Velho" - Joseph Heller
Joseph Heller faleceu em 12 de dezembro de 1999 aos 76 anos. O escritor norte americano nasceu em 1923 no Brooklyn em Nova York, filho de uma família judaica. Logo em 1961 no seu primeiro romance, “Ardil 22” (“Catch 22” no original), cravou um clássico na literatura da segunda metade do século passado. Sua principal obra gerou bons filhos como no filme M*A*S*H dirigido em 1970 por Robert Altman e na série televisa de mesmo nome.
A carreira de Heller não teve muitos livros (menos de 10 no total) apesar de duradoura, mas a qualidade sempre se fez presente. Seu discurso anárquico e repleto de sátiras e críticas bem humoradas sobre instituições e a sociedade em geral, era a principal marca. “Retrato do Artista Quando Velho” foi seu último livro, lançado postumamente em 2000 e serve como um réquiem justo e bem pessoal, carregando em vários níveis todos seus tons e cores.
O título, uma evidente brincadeira com “Retrato do Artista Quando Jovem” do grande James Joyce, traz o autor transmutado em Eugene Pota, um escritor que teve uma carreira sólida e bem sucedida, mas que agora já com mais de 70 anos não sabe o fazer da vida. Pota não recebe mais os convites de outrora na mesma intensidade. Por mais que nunca tenha se dignado muito a responder, sente falta. Seu telefone não trabalha como antigamente.
A única saída que lhe vem a mente é lançar um novo livro. Mas sobre o quê? A sua exigência pessoal e a proporcional diminuição da criatividade lhe impedem de abordar temas já passados anteriormente. Não quer escrever também sobre o que monstros como Henry James, William Faulkner, James Joyce e Ernest Hemingway já escreveram. O que fazer então? Que rumo tomar? O humor peculiar de Joseph Heller atira para todos os lados.
Eugene Pota tenta começar diversos livros. Vai de reescrever clássicos gregos a dar um novo olhar para as aventuras de Tom Sawyer. Começa um trabalho com o nome “Biografia Sexual de Minha Mulher” (para desespero desta) e tenta encaminhá-lo de todo jeito, mostrando para seu editor e alguns amigos. Vai pulando de idéia em idéia, até perceber que nada vai muito além, para desespero próprio. O tempo passa para todos, é a triste conclusão.
“Retrato do Artista Quando Velho” tem algumas limitações e defeitos, normais por se tratar de um livro póstumo, mas bem menores comparando com outros lançados na mesma situação. Joseph Heller lança seu olhar singular sobre o passar do tempo e sobre o oficio do escritor, envergando críticas severas e bem humoradas contra sua profissão e mais uma vez sobre o cotidiano de um modo geral. Um divertimento mordaz e repleto de classe.
Sobre o filme “M*A*S*H*, passe aqui.
segunda-feira, 14 de junho de 2010
"A Sentimental Education" - Rod Jones - 2010
Junto com o Idlewild, o guitarrista escocês Rod Jones já prestou alguns bons serviços a música, principalmente em discos como “The Remote Part” de 2002 e “Make Another Word” de 2007. Em 2010 resolveu dar o seu primeiro vôo solo com “A Sentimental Education”. O vocalista e líder do Idlewild, Roody Woomble, já tinha se aventurado por esse caminho no bonito “My Secret Is My Silence” (no qual Rod Jones participou) em 2007.
“A Sentimental Education” (não, não tem nada a ver com o Kid Abelha) traz 12 canções em pouco mais de 34 minutos. Uma pequena coleção de folk e country-rock dos anos 60. Gravado na sua casa em Leith na Escócia e masterizado posteriormente em Cardiff no País de Gales, o disco é um retrato singelo de um músico criando, compondo e produzindo, sem estar muito interessado se será ouvido ou não. E talvez seja nisso que resida a maior qualidade.
Rod Jones chamou alguns amigos como Josef Sykora nos teclados, Jacqueline Irvine no violão e vocais e Catrin Pryce-Jones no violino para engrossar o corpo das suas músicas. Os temas não são muito variados, transitam por amores, cotidiano e tempo, apesar de algumas viagens diferentes com “A Pirate Song”, uma das poucas canções agitadas do disco. Na grande maioria temos a voz pequena do músico, funcionando bem em cima de bases suaves.
As influências vão se mostrando a cada faixa. “Sing It Alone” é um folk bem típico, com vocal dobrado, ao estilo de tantos nos anos 60. “Wonderful” parece um Simon And Garfunkel mais moderno e deliciosamente pop. “Your Deaf Heart” abraça Crosby, Stills, Nash And Young. “No Sound” evoca o som do The Byrds. A bonita “The Longingness Of Time” lembra Bert Jansch ou até mesmo o Pentagle, grupo do qual o músico também fez parte.
“A Sentimental Education” muito provavelmente vai passar batido para a grande maioria dos seus potenciais ouvintes. Afinal, são tantos lançamentos no dia a dia e diversos músicos produzindo nessa mesma seara. No entanto, aqueles que escutarem o álbum, muito provavelmente vão voltar para ele algumas vezes e sacar no player canções como “Broken Flowers”, com seus violinos e melodia, colocando assim um pouco mais de beleza no ar.
Site Oficial: http://www.rodjonesmusic.com
My Space: http://www.myspace.com/rodjonssolo
sábado, 12 de junho de 2010
"Zona Verde" - 2010
A direção é do inglês Paul Greengrass. O ator principal é Matt Damon. O roteiro traz um militar que ao se ver no meio de uma conspiração, resolve ir contra todos para solucionar o esquema e desmascarar os culpados. E apesar de parecer, não é mais um filme da franquia Bourne. É “Zona Verde”, o novo trabalho da dupla citada acima. As semelhanças com os dois primeiros filmes do agente desmemoriado acabam trazendo mais malefícios que virtudes.
O diretor que comandou os primeiros (bons) longas da série Bourne, tem no currículo filmes bem melhores como “Vôo United 93” e “Domingo Sangrento”, mas acaba deslizando na repetição no seu novo trabalho. “Zona Verde” se passa no Iraque, pouco tempo depois da invasão dos USA e foca no oficial Roy Miller (Matt Damon), que com sua equipe procura pelas famosas e nunca vistas armas de destruição em massa de Saddam Hussein.
Acontece que mesmo de posse de relatórios da inteligência do exército, Miller não encontra nada. Absolutamente nada. Ao expor suas dúvidas em uma reunião, Martin Brown (Brendan Gleeson), o chefe da CIA no Iraque se aproxima e mostra como as coisas realmente funcionam. O responsável pelas operações do Pentágono, Clark Poundstone (Greg Kinnear) está forjando informações. Logo um rompante heróico toma conta do oficial.
Com a história mais ou menos montada, o filme vai se desenvolvendo com algumas falhas no roteiro, principalmente na facilidade com o que oficial desgarrado atinge seus objetivos, e revela uma conspiração que inclui até a imprensa, que ganha uma senhora espetada do diretor. A câmera nervosa se faz presente, tremida a cada quadro de perseguição, a parte técnica não tem quaisquer erros e Matt Damon está correto, mesmo longe de ser espetacular.
“Zona Verde” não é ruim ou desonesto. O seu maior problema é a falta de criatividade, ainda mais quando passeia no terreno da guerra do Iraque, depois que o “Guerra ao Terror” de Kathryn Bigelow chegou a grande tela, além de se assemelhar muito em forma com os “Bourne” da dupla. Mesmo assim, se não tiver nada para fazer, serve para passar o tempo e é bem melhor do que uns 90% dos trabalhos de ação com a assinatura de Jerry Bruckheimer.
quinta-feira, 10 de junho de 2010
"Apanhador Só" - Apanhador Só - 2010
Apanhador Só. Preste bem atenção nesse nome em 2010. O grupo gaúcho desembarca no seu primeiro disco nesse ano e chega com um trabalho repleto de qualidades. Carregando o mesmo nome da banda, o álbum foi forjado de maneira independente depois de dois Ep´s lançados em 2006 e 2008. O quarteto é formado por Alexandre Kumpinski no vocal e guitarra, Felipe Zancanaro na guitarra, Fernão Agra no baixo e Martin Estevez na bateria.
“Apanhador Só” está disponível gratuitamente para download no site oficial e na página no Trama Virtual (links abaixo). São 13 faixas que unem mpb e rock, Clube da Esquina e Tortoise, Tom Zé e Radiohead, Los Hermanos e The Sea And Cake. As letras são bem construídas e ora contam histórias de uma maneira meio antiga, ora sacam da carteira tiros rápidos de ironia. Nenhuma faixa passa sem provocar alguma reação positiva no ouvinte.
A abertura já traz uma das grandes faixas do ano até agora. “Um Rei e o Zé”, parceria de Alexandre Kumpinski com Ian Ramil (filho de Vitor Ramil) é deliciosa, alternando melodia e um peso moderado. Fecha com versos bem escritos: “não leva a mal/eu só queria poder ter outra filosofia/mas não nasci para conversar com rei”. São muitos os destaques. “Maria Augusta”, por exemplo, mistura Mutantes, psicodelia, forró, barulhos diversos e guitarras.
“Peixeiro” traz desesperança quando canta “o nosso amor, uma garrafa de vinho/virando vinagre devagarinho”. “Bem-Me-Leve” une Fernando Venturini e Los Hermanos. “Nescafé” vem com guitarras, desamor, cambalachos e milongas. “Jesus, O Padeiro e O Coveiro” é cheia de efeitos e faz o Violeta de Outono namorar o Pavement. “Vila do ½ Dia” muda tudo de novo. Insanamente alegre, pop, ensolarada. Canção para manhãs de domingo.
O Apanhador Só estréia mostrando um interessante mosaico de influências que vão conversando devagarinho, sem pressa, puxando uma cadeira, abrindo a primeira cerveja e quando menos se percebe estão completamente envolvidas, abraçadas e convivendo em harmonia. Tipo de banda que a primeira audição do disco serve somente para conquistar, deixando o verdadeiro prazer para futuras audições. Gratíssima surpresa do ano.
O disco está disponível gratuitamente para download nos links abaixo:
http://www.apanhadorso.com
http://tramavirtual.uol.com.br/artistas/apanhador_so
terça-feira, 8 de junho de 2010
"Afluentes do Rio Silencioso" - John Wray
De acordo com a descrição do Wikipédia a esquizofrenia “é um transtorno psíquico severo que se caracteriza classicamente pelos seguintes sintomas: alterações do pensamento, alucinações (visuais, sinestésicas, e sobretudo auditivas); delírios e alterações no contato da realidade.” Estima-se que 1% da população mundial sofra com esse transtorno mental. O escritor John Wray mergulha literalmente de cabeça nesse universo para desenvolver um livro espetacular.
John Wray vem sendo aclamado pela crítica especializada norte americana como um dos melhores escritores da sua geração. Nascido em 1971 e caminhando para os 40 anos, já lançou três livros (os dois primeiros ainda inéditos por aqui), sendo o último o excelente “Afluentes do Rio Silencioso” (originalmente “Lowboy”). Chegando as livrarias nesse ano com 303 páginas pela Companhia das Letras, John Wray escreve com competência e destreza.
Na sua trama, Lowboy é um jovem de 16 anos que sofre de esquizofrenia paranoide e acaba de fugir do hospital onde ficou por um ano e meio. Na verdade seu nome é William Heller, o apelido de Lowboy é um trocadilho com “garoto para baixo” pela sua depressão e “garoto de baixo”, por gostar muito dos espaços subterrâneos do metrô de Nova York. Não é surpresa então que ao fugir se encaminhe diretamente para o querido destino abaixo do solo.
Na sua cabeça, Lowboy tem uma missão dificílima: Precisa salvar o mundo que está aquecendo até chegar o ponto em que vai incendiar todo. Para realizar a proeza precisa urgentemente fazer sexo pela primeira vez, libertando assim algo dentro de si que vai parar tudo. No maior metrô do mundo (com mais de 360 quilômetros de rota), o jovem se mete em pequenas aventuras regadas a delírios e convivência com habitantes nada comuns ou normais.
Fora disso, o outro lado da história se desenvolve tendo como pilares a mãe de William Heller, a qual chama carinhosamente de “Violet”, apesar de o seu nome verdadeiro ser Yda. No encalço do garoto perdido está também um detetive especializado da polícia, que começa seguro das suas forças, mas vai vendo estas se esvaírem pouco a pouco, quando começa a montar o surpreendente quebra cabeça familiar de tragédia, dor e culpa que está no meio.
Ao escrever sobre o ponto de vista das coisas de “Lowboy”, era necessário muito tato e zelo para não descambar para o drama comum ou mesmo ofender os portadores do transtorno. John Wray consegue fugir de ambos os caminhos de maneira singular e ainda cria um romance extremamente sensível e bem acabado, com toques de humor, dor e emoção quase que na mesma proporção, fazendo nascer um desenrolar final forte e poderoso.
domingo, 6 de junho de 2010
"O Fantástico Sr. Raposo" - 2010
O diretor norte americano Wes Anderson já criou um estilo próprio de fazer cinema aos 41 anos apenas. Esse estilo facilmente identificado para aqueles que seguem sua carreira rendeu ótimos trabalhos como “Os Excêntricos Tenenbaums” de 2001. Em outros como “A Vida Marinha Com Steve Zissou” de 2004 e “Viagem a Darjeeling” de 2007 o resultado foi confuso, plastificado e mediano, culpa de um certo exagero do seu próprio estilo e concepções.
“O Fantástico Sr. Raposo” é a primeira incursão de Wes Anderson no campo da animação. Usando primordialmente a técnica do Stop-motion leva a tela uma adaptação do escritor Roald Dahl (o mesmo de “A Fantástica Fábrica de Chocolate”). Seu mais recente filme não é direcionado para as crianças, apesar de ter alguns momentos em que possa agradar este publico. “O Fantástico Sr. Raposo” é para adultos e versa sobre acomodação e a própria natureza.
O diretor convidou um time de peso para dublar as falas dos personagens, como por exemplo, George Clooney, Meryl Streep, Adrien Body, William Dafoe e Bill Murray, além de Jarvis Cocker (ex-Pulp) que ainda contribuiu na trilha sonora e na principal canção do longa. A inserção de pequenas pílulas de cultura pop em geral está novamente presente e a trilha sonora tem Rolling Stones e Beach Boys, o que ajuda a melhorar o razoável resultado final.
O Sr. Raposo que dá nome ao filme é um ex-ladrão de fazendas que se redime após ser pego junto com a namorada e descobrir que vai ser pai. Depois da regeneração segue uma vida normal e ordinária como os demais. Tem um trabalho comum (escreve em um jornal), se preocupa com a família, tanto no que tange a comida quanto a moradia e tem um relacionamento social padrão. Só que lá no fundo cresce cada vez mais uma perigosa inquietação.
Essa inquietação o faz atacar novamente três grandes fazendeiros da cidade indo de encontro a promessa feita para a esposa. Os roubos de galinhas, gansos e cidra, provocam a ira dos atingidos, que partem com tudo para cima dele, não medindo esforços para realizar sua vingança. Nisso, o Sr. Raposo perde tudo e precisa se virar para achar um modo de alimentar sua família, um modo de sobreviver, dentro do imenso caos em que acabou se metendo.
Wes Anderson traz alguns personagens interessantes e consegue bons momentos, ao versar sobre o quanto nos acomodamos no decorrer da vida. Na verdade essa premissa não é tão nova assim nos seus filmes, o que já dá um gosto morno ao filme. Esse gosto se estende por quase todo o trabalho infelizmente. Dentro do seu criativo universo próprio o diretor precisa imensamente se reinventar e soar fantástico novamente, assim como seu Sr. Raposo.
sexta-feira, 4 de junho de 2010
"Mother - A Busca Pela Verdade" - 2009
Até onde uma mãe pode chegar devido ao amor pelo filho? Quanto sofrimento pode agüentar? Até onde chegam seus limites morais? “Mother - A Busca Pela Verdade” responde a essas perguntas. O quarto filme do diretor coreano Joon-ho Bong (de “O Hospedeiro” e “Memórias de Um Assassino”) enche os olhos, baseado nessa trama central. Ao mesmo tempo que cria um competente thriller policial satiriza a sociedade em tons de comédia.
Em uma cidade pequena, Yoon Do-joon (Bin Won) é um adulto que aos vinte e poucos anos vive sobre a bainha da mãe. Com problemas mentais, Do-jonn é lento, não compreende bem as coisas e esquece a grande maioria. Sua vida seria cômica se não fosse trágica. A mãe (Kim Hye-ja em atuação esplendorosa) vive vendendo raízes e praticando acupuntura às escondidas, para o sustento do filho. É extremamente protetora e preocupada.
A vida corre mais ou menos dentro da rotina (nada normal) de mãe e filho, quando ocorre um assassinato de uma jovem colegial na cidade. Há anos que o lugar não lidava com algo do tipo e absurdos e mais absurdos são cometidos na resolução do caso. O diretor detona polícia, sistema jurídico e a hipocrisia da sociedade, através da ineficiência da polícia, que logo escolhe o jovem Do-joon como autor do crime e pelo ridículo advogado escolhido para a defesa.
O tom de sátira utilizado pelo diretor nesse ponto é realmente brilhante. Parece leve, mas carrega fortes críticas embutidas. Devido a ineficiência da polícia e do seu advogado, a mãe de Do-joon resolve iniciar uma investigação própria para achar o real assassino da menina. Essa investigação feita com amadorismo e por caminhos estranhos, leva essa mãe a percorrer com coragem e dedicação, estradas sujas e imorais, onde a falta de orgulho é necessária.
“Mother - A Busca Pela Verdade” é mais um exemplo de excelência do cinema coreano, que ano após ano apresenta mais surpreendentes trabalhos. No novo filme de Joon-ho Bong, a surpresa faz parte do jogo. O roteiro aparece com reviravoltas realmente inesperadas, vinculado a uma ótima fotografia e um impecável trabalho dos atores. Ninguém é realmente bom ou mau nessa visão. Faz-se o necessário. Um teste para o amor de qualquer mãe.
quarta-feira, 2 de junho de 2010
"Possum Dixon" - Possum Dixon - 1993
Tivemos bandas primorosas nos anos 90. Algumas alcançaram fama e estrelato e outras tiveram pouco reconhecimento, ainda que tivessem tido relativo sucesso. Aqui no Brasil, por exemplo, foi a década que os lançamentos começaram a chegar em uma proporção honesta e os importados estavam a um preço justo. Não se compara a propulsão da música em tempos de internet e downloads por todo lugar, mas era uma grande coisa para a época.
Uma dessas bandas foi o Possum Dixon. Vindo de Los Angeles nos Estados Unidos, foi formada em 1989 por Robert Zabrecky (vocal e baixo) e Celso Chaves (guitarra), que retiraram o nome de um assassino que teve a história exibida em um programa de TV. Depois entraram Robert O’ Sullivan (guitarra, piano, harmônica e vocais) e Richard Treuel (bateria). Em 1993, o grupo estreou pela Interscope Records com um disco homônimo seminal.
“Possum Dixon”, o disco, unia punk, new wave e pós punk com muita energia, melodias arrebatadoras e refrões grudentos. Devo, Talking Heads, The Police e Blondie caminhavam de mãos dadas na visceral música do grupo. Robert Zabrecky, compositor da maioria das canções, era um Elvis Costello meio desajustado, que faltava se matar no palco atrás do seu baixo. As letras versavam sobre amor, perda e o cotidiano louco e meio irreal da sua cidade natal.
O disco traz onze faixas, que com exceção feita a brincadeira experimental de “John Struck Lucy” eram potenciais hits, singles certeiros. A produção feita em conjunto com Earle Mankey que trazia trabalhos anteriores com bandas como The Dickies e The Runaways, adubava a pegada punk e a urgência que permeia todas as canções. O início com a bateria forte de “Nerves” engatada em seqüência com “In Buildings”, já abre um sorriso no rosto.
“Watch The Girl Destroy Me”, o quase sucesso da banda vem depois, com refrão para ser cantado em plenos pulmões. “She Drives” e “We’re All Happy”, usam cinismo e soam pop’s e rápidas, com seus fraseados curtos de guitarra. “Invisible” é uma balada torta e estranha inserida dentro do cenário apocalíptico de Los Angeles. “Pharmaceutical Itch”, lembra (bem) o The Police e traz o baixo suando na frente, enquanto a banda explode atrás.
“Executive Slacks” é bem humorada, uma new wave descarada e caótica. “Regina” tem um toque latino, um clima meio “La Bamba” embalando um refrão bastante calhorda. Para cantar junto. A já citada “John Struck Lucy” é uma pequena viagem experimental de menos de um minuto, que abre caminho para “Elevators”, encerrando o disco com um dos refrões mais grudentos do trabalho e repleta de desconstruções de ritmo no seu andamento.
O Possum Dixon lançou mais dois discos antes de acabar, “Star Maps” em 1996 e “New Sheets” em 1998, que apesar de serem bons (principalmente o último) já não exalavam o mesmo odor. Problemas pessoais, drogas e brigas internas causaram o término precoce. Todos seguiram sua vida (Robert Zabrecky mantêm, por exemplo, uma sólida carreira de ator e mágico!!), mas provavelmente conceberam o maior testemunho artístico das suas vidas em 1993.
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