O governo brasileiro sempre escondeu (e ainda esconde) muita coisa dos tempos do regime militar. Tempos de uma ditadura que dizimou liberdades individuais, censurou nossa cultura e matou milhares de cidadãos contrários as suas idéias, deixando seus corpos apodrecerem embaixo de um chão qualquer sem explicações nem para a família. “Araguaya - Conspiração do Silêncio” filme rodado em 2004, com alguns prêmios no currículo, mas que só agora chega ao circuito comercial, conta uma dessas “coisas”. O primeiro filme do diretor Ronaldo Duque conta a história da Guerrilha do Araguaia que aconteceu no final dos anos 60 e inicio dos 70 no sul do Pará e permanece sem maiores informações até hoje. O diretor fez uma extensa pesquisa sobre o tema, tentando contar da forma mais honesta possível essa guerrilha no meio da mata, feita por jovens estudantes que efetivamente demorou três anos e levou mais de 10.000 soldados no seu encalço pelas matas da Amazônia. O filme mostra o movimento através de personagens fictícios, mas baseados em fatos reais, incluindo no decorrer do longa os envolvidos na época como o ex-presidente do PT José Genoino, que colabora com seu depoimento. Narrado pelo personagem Padre Chico (Stephane Brodt), um missionário francês que desde a década de 60 se encontrava na reunião, o filme mostra todo o envolvimento de jovens inexperientes, mas dispostos a irem longe para ter um país livre com uma população que vive de forma simples e dentro de um limite de miséria bem expressivo. Com nomes fortes no elenco como Northon Nascimento (Osvaldão), Françoise Forton (Dora), Danton Mello (Carlos), Fernanda Maiorano (e sua excelente Tininha), Cacá Amaral (Carlos), entre atores locais, o diretor consegue extrair um ótimo resultado. As locações foram realizadas na cidade de Marituba, que fica a alguns poucos quilômetros da capital do Pará, a cidade de Belém, o que ajudou bastante na boa fotografia do filme. O que mais impressiona é saber que tão pouca coisa mudou na área, na época a briga por terra se intensificava com a abertura da Transamazônica, grileiros, mateiros e posseiros tomavam terras dos ribeirinhos (moradores da região) na força, para seu usufruto ou de fazendeiros, políticos e militares. Mais de 30 anos depois isso continua acontecendo, os conflitos por terra produzem mortes a cada ano no estado e o prometido desenvolvimento da região não aconteceu, grande parte da Rodovia Transamazônica ainda é um imenso caos. Outro bom lado do filme é perceber que toda a briga contra um regime autoritário ter sido tão intensa e parte das pessoas envolvidas nessa luta, depois de terem chegado ao poder, se envolveram com tanta lama, sujeita e corrupção, como é o caso de José Genoino, por exemplo, tendo em vista todos os escândalos do Governo Lula. O poder realmente corrompe. A ditadura brasileira usou e abusou do país e até hoje esconde seus mortos sem que a imprensa faça muito alarde para a busca de culpados e punições para os envolvidos, preferindo dar mais atenção as ditaduras vizinhas do que voltar os olhos para o próprio umbigo, retrato de um país onde o “coronelismo” ainda não foi extinto e se encontra disfarçado entre políticos, empresários e militares do país. Ronaldo Duque além de dirigir um bom filme, com uma direção precisa, ótimas atuações e uma parte técnica bem resolvida, coloca os cinco dedos em uma ferida que queremos tirar da nossa memória, elaborando assim um retrato de valor histórico primordial e uma pequena homenagem a todos aqueles que até hoje ainda estão desaparecidos, só por acreditarem que podiam viver de forma mais digna.
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